terça-feira, 6 de outubro de 2015

Eu, minha sogra e o futebol

No começo não ia muito com minha cara. Também pudera, me conheceu como coabitante do coração e da casa de sua filha mais nova, sem nem mesmo a formalidade de um aviso, quiçá pedido de casamento.

Foi assim até que descobriu que eu era cruzeirense. Atleticana doente, o que é quase um pleonasmo, passava roupas escutando Cafunga e Fernando Sasso no radinho de pilhas. E como o Galo andava bicando sem dó a Raposa naqueles tempos, o telefone de casa passou a tocar aos domingos, ali pelas seis e pouco:

- Alô?

- D Antonieta!!!

- Saudade docêis!!!!

- Mas como a Sra. é falsa, não minha sogra?

- Porque???, perguntava ela na sua melhor voz inocente.

- Sra tá ligando por causa do futebol!!!!!

- Nem vi futebol hoje... como foi????

- O Cruzeiro goleou o Galo...

- Mentira! O Galo ganhou!

- Tá vendo como a sra é falsa?

E eu ficava ouvindo a risada boa do lado de lá.

Outro dia:

- Mauro? Aprendi uma música nova!

- Cantaí, D Antonieta!

- “O Cruzeiro
Tem cinco estrelas
Cinco estrelas ele tem
Só não tem
A amarelinha
Talvez ano que vem”.

Um dia a levei ao Mineirão num RapoGalo. Das cadeiras, onde os torcedores se misturavam, ela viu a Massa empurrar seu time da arquibancada, o que até para nós cruzeirenses é de arrepiar, claro que de raiva e frustração. O Galo ganhou, 1 x 0, na hora do gol ela pulou e me abraçou, e eu me vi festejando um gol atleticano! Digaí, leitor, você faria isso para fazer sua sogra feliz? Até hoje, na família, sou lembrado por esse feito!

Aí veio 2003. Cruzeiro de Alex e Luxa, Campeão de Tudo. Ali pelo mês de novembro, liguei:

- D Antonieta, aprendi uma música nova!

- ...

- “O Cruzeiro
Tem cinco estrelas
Cinco estrelas ele tem
Só não tem
A amarelinha
Que vem no mês que vem!”.

E assim foi: Libertadores Cruzeiro, Galo 4 x 0 Cruzeiro (também lembrado como Fábio de Costas), Galo rebaixado, Cruzeiro 6 x 1 Galo, Libertadores Galo, Cruzeiro bi 2013 e 2014, esse ano Galo quase campeão, Cruzeiro quase rebaixado...

Agora não mais.

D Antonieta, a quem o Alzheimer já tinha tomado parte do espírito, deixou-nos em definitivo nesta segunda-feira.

6 comentários:

NewtonC disse... [Responder comentário]

Gostei da crônica. Valeu, Mauro.

Mauro Assis disse... [Responder comentário]

@NewtonC

QUe bom que vc gostou. Saudades da sogrinha...

Paulo Lins disse... [Responder comentário]

Mauro, o Trivela fez justiça ao seu texto! Acho que você é o cruzeirense mais democrático do mundo! Sogra já não costuma ser festejada, sendo torcedora rival, então.... Sou atleticano e nunca tive sogra atleticana, mas gosto de todas (até hoje) assim mesmo.

Mauro Assis disse... [Responder comentário]

@Paulo Lins

Paulo, uma vez eu ouvi o Juca Chaves dizer que o brasileiro não gosta de futebol, ele gosta de ver o seu time ganhar.

Eu gosto é de futebol mesmo.

Daniela disse... [Responder comentário]

Uma cronica muito boa, muito do coracao.
Sinto com voces e tenho voces juntinha do coracao. Um beijao enorme da alemanha.

Rosane disse... [Responder comentário]

Hoje o galo pra mim é simbolo de alegria mas tb de tristeza já que o escudo e as listras se confundem com a imagem do meu falecido irmão, seu amigo de sempre. Linda homenagem à sua sogra e lendo, hoje, não tem como nāo me emocionar.